Documento aponta que propostas que restringem o acesso de pessoas trans a espaços públicos violam direitos fundamentais e reforçam estigmas

Projetos de lei que tentam impedir pessoas trans de utilizarem banheiros e outros espaços públicos de acordo com sua identidade de gênero foram classificados como inconstitucionais pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. Em nota técnica divulgada nesta semana, o Ministério Público Federal alertou que tais iniciativas afrontam não apenas a Constituição brasileira, mas também compromissos internacionais firmados pelo país.
O documento é resultado do trabalho do grupo voltado à população LGBTQIA+ e analisou 60 propostas legislativas com conteúdos discriminatórios apenas entre janeiro e março de 2023. As medidas incluem desde a proibição do uso de linguagem neutra até a exclusão de pessoas trans em práticas esportivas e o bloqueio de acesso a tratamentos médicos específicos.
Para os autores da nota, impedir o uso de banheiros conforme a identidade de gênero representa risco direto à saúde física e mental das pessoas trans, já que o medo de violência e humilhações leva muitas a evitarem o uso desses espaços, gerando complicações como infecções urinárias e doenças renais. “Pessoas trans vão ao banheiro por necessidade fisiológica, como qualquer outro cidadão”, destacaram Nicolao Dino e Lucas Dias, procurador dos Direitos do Cidadão e coordenador do grupo, respectivamente.
Os argumentos dos defensores dessas propostas, que alegam proteção a mulheres e crianças cisgênero, foram classificados como infundados pela Procuradoria. Para o MPF, tais justificativas apenas reforçam estigmas e desinformação sobre a população trans. “A transgeneridade não pode ser confundida com perversão ou doença”, afirmaram os procuradores.
A nota reafirma que o princípio da dignidade humana, garantido pela Constituição, assegura o reconhecimento da identidade de gênero e o direito à igualdade. O texto também esclarece que o entendimento do STF e de entidades internacionais já reconhece que o sexo biológico não deve ser o único critério para acesso a espaços públicos, defendendo o respeito à vivência e identidade de cada indivíduo.